Rentrée: quando a coisa começa.

Exatamente uma semana desde que eu não posto, mas não morri. De fato o que ocorre é que nos primeiros dias na residência a nossa atenção está sempre voltada para resolver os problemas da chegada... Ontem foi a rentrée oficial da escola. Isso quer dizer que ontem foi o dia em que o semestre começou para valer, os alunos novos foram acolhidos como uma turma (com direito a foto logo no primeiro dia) e os procedimentos comuns para nativos e estrangeiros começaram. No entanto, vale voltar um pouco no tempo, já que os franceses começaram a chegar bem antes.


A chegada
Os primeiros franceses chegaram no dia 04 de setembro, entre eles o meu colocatário(usuamente chamado de coloc). Tinha muito medo de pegar um cara desorganizado, beligerante e/ou chato. No entanto, tive sorte. O cara é um rapaz do interior, de uma cidade que não deve ser maior do que o meu bairro. Ele é organizado, amistável e dá indícios de que é uma pessoa fácil de se conviver. Para ele, porém, nem tudo são flores. Ele ficou extremamente feliz quando descobriu que o coloc dele seria brasileiro, pois acreditou que teria alguém para falar de futebol. Imaginem a decepção dele quando ele descobriu que eu sou o único brasileiro que não consigue manter uma conversa de mais de dois minutos sobre o assunto.

Ao longo dos dias mais franceses chegaram e os estrangeiros partilhavam entre si as impressões sobre seus respectivos colocs. No sábado, a maior parte já tinha chegado e aconteceu a soirée mousse, algo como "a noite da espuma". Eu já havia ouvido falar disso antes e já estava preparado para o que ia acontecer, mas minha reação foi completamente diferente do que eu imaginava.

No último andar da residência 2 (eu moro na 1), os franceses jogaram água e sabão no corredor. A idéia era correr, saltar e escorregar até o outro lado do corredor. Evidentemente após o consumo de bebidas alcóolicas. É uma coisa idiota, infantil e completamente louca. E eu fiz. Apenas dois dos brasileiros fizeram, para ser mais preciso. Acreditava piamente que eu jamais faria isso, mas fiz. A razão é simples: onde e quanto no Brasil seria possível fazer uma coisa dessas e ainda ser considerado normal? Eu tenho uma filosofia que consiste em fazer o máximo para criticar algo apenas depois de conhecer, mas isso não vale para drogas e muito menos para opções sexuais! Depois de quatro escorregadas no corredor (duas idas e voltas), alguns hematomas e um arranhão que me faz lembrar minha aventura toda vez que eu me encosto numa cadeira, eu retornei ao meu estado de sensatez habitual.



A turma
A minha turma, que aqui é chamada de promotion ou simplesmente promo é composta de 330 pessoas, das quais 30% são mulheres. Eles vêm de todos os lugares da França e tem sido muito fácil fazer novas amizades durante esses dias. Na realidade, agora é o momento da integração e quando todos os grupos estiverem cristalizados vai ser muito difícil conhecer outras pessoas. Ou seja, é preciso socializar-se a todo custo agora. Como meu objetivo é poder transitar entre vários grupos com liberdade, eu procuro conhecer o máximo de pessoas possíveis, homens e mulheres.

Acredito que eu seja o brasileiro mais enturmado com os franceses no momento. Passo boa parte do meu tempo com um grupo deles, que foi se agregando aos poucos ao juntar-se fragmentos de outros grupos e são pessoas com quem descobri afinidade imediata. Foi assim que conheci dois franceses que tocam gaita e temos trocado algumas figurinhas.

Foi por causa desse grupo que eu ganhei um apelido. Enquanto conversávamos sobre insultos nas mais diversas línguas, eles perguntaram quais os insultos em francês que eu sabia. Além dos clássicos eu disse que havia aprendido dois ao ler o romance "O estrangeiro" de Albert Camus em francês. São eles: saloud(imbecil) e charogne(carniça). Eles riam muito por eu ter dito este último e me falaram que isso é coisa de velho aqui, que se eu insultasse alguém dessa forma eu seria motivo de piadas. Não foi preciso insultar ninguém: no dia seguinte ao me apresentar a uma garota eu ouvi a frase "C'est toi l'Angelo charogne?".

Tenho observado também que os brasileiros são muito populares. Muitos já me disseram que a popularidade era sobretudo entre as mulheres, mas acho que a coisa não é bem assim. Estou me acostumando a ser cumprimentado por caras bêbados que eu não conheço e ser chamado pelo meu nome por eles. Isso acontece com outros brasileiros também.

Na cerimônia de recepção cada aluno ganhou de presente uma bolsa e um pen drive de 2 Gb. Durante a tarde ocorreu uma visita pela escola e tivemos oportunidade de visitar alguns laboratórios. Tive sorte, pois visitei aqueles que estão mais ligados a engenharia mecânica. O primeiro, e o que eu mais queria visitar, foi o laboratório de mecânica dos fluidos. Lá havia um túnel de vento de circuito aberto muito grande, creio que de mais de 25 metros de comprimento, e uma seção de teste que eu estimo em 3 X 2,5 m. Havia outros três túneis de vento menores. O outro laboratório foi o de engenharia civil e materiais, que realiza pesquisas na área de resistência de materiais e crash tests automobilísticos, aeronáuticos e ferroviários.

Neste fim de semana ocorrerá o WEI (Week-end d'integration). É a última grande oportunidade de fazer amigos e trata-se de um fim de semana em bangalôs em alguma praia cuja localização é segredo de estado. Outra oportunidade foi o tonus.

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