Saindo de Nantes... e chegando em Paris

Texto feito nas pressas e com o pouco de energia que me sobra a cada noite após voltar do estágio.

Ando numa situação provisória bastante precária, dividindo um sótão até o fim do mês com o Thiago e a Patrícia, colegas meus de Nantes. O espaço é éxiguo, os choques da minha cabeça com o teto baixo são frequentes e a internet é pouco estável. Além disso, ando às voltas com os problemas gerados pela entrega das chaves do apartamento antigo: venda dos móveis e eletrodomésticos, limpeza da casa, etc. Infelizmente tenho que voltar praticamente a cada fim de semana, assim como o Thiago e o Vladimir, para colocar um pouco de ordem nas coisas, visto que a Katinka, que foi a única a ter ficado em Nantes, tem se mostrado de uma inaptidão completa para resolver um problema por menor que ele seja.

Finalmente deixei Nantes, a cidade que foi meu lar durante mais de um ano e meio. Minhas opiniões a respeito são bem divididas. Se por um lado Nantes é uma cidade agradabilíssima para morar, com um sistema de transporte impecável, uma limpeza irreprimível e uma qualidade e custo de vida de fazer inveja ao resto da França, foi uma cidade que me ofereceu poucos momentos intensos de alegria. Talvez o clima nublado que predomina em quase metade do ano tenha sido uma das fontes mais importantes de desânimo, considerando os dois péssimos invernos que eu oasse...

A população de Nantes é bem jovem pros padrões europeus, a cidade é cheia de escolas e universidades. A população universitária é muito ativa. Mas é predominantemente francesa. Isso sempre me deu a impressão de que a integração era mais difícil. Não a integração na escola, isso nunca foi problema para mim, mas a aproximação de desconhecidos, a criação de laços com pessoas fora do seu círculo habitual de convivências.

Essa dificuldade é sem dúvida o maior contraste que eu vivi quando vim a Paris fazer meu primeiro estágio. Acredito que o fato de morar na Cité Universitaire, um campus imenso, cheio de residências universitárias, contando com mais de 2000 residentes predominantemente estrangeiros, tenha sido fundamental para criar a impressão de cidade cosmopolita que eu carrego até hoje. Em Paris, em pouco menos de dois meses, eu criei um círculo de amizades extra-cotidianas que eu nunca consegui superar em Nantes.

Isso só se reforçou agora que eu estou de volta a Paris. Neste domingo eu fui encontrar dois amigos que faziam um piquenique aos pés da Torre Eiffel. Eles estavam num grupo de umas vinte pessoas, das quais eu não conhecia mais do que cinco. Me integrei brevemente com alguns poucos que estavma por lá. Outras pessoas chegaram. Meus amigos foram embora. Me integrei com os amigos das pessoas que eu conheci ao chegar. Em pouco menos de duas horas eu estava num restaurante comendo, bebendo e batendo um papo super legal e descontraído com pessoas que eu nunca vira antes. Saí dali com a promessa de reencontros futuros. Essa naturalidade em se aproximar das pessoas sempre foi o que mais me fez falta em Nantes.

Entretanto, por mais que eu tenha me queixado tanto disso eu sinto falta da minha cidade. Dos poucos, e bons, amigos que eu fiz e que agora terei dificuldade em reencontrar. Das histórias que eu vivi, boas e más. Da minha bicicleta mágica que me trazia de volta ao fim de cada noite de boemia a despeito do meu equilíbrio e da minha memória. Do nosso apartamento que conseguimos com tanto esforço e cujos cômodos vazios preenchemos de móveis e memórias, vivendo de uma forma sem luxo, mas confortável e autônoma.

Há pouco mais de um mês atrás eu recebi dois excelentes amigos meus de Paris: a Juliana e o Rodrigo. Eles passaram um fim de semana comigo em Nantes.Eles foram a quinta e última visita que eu recebi em Nantes em 20 meses. Eu lhes mostrei a cidade. Cada pedacinho que eu conhecia, cada fato histórico que eu tinha lido com tanto esmero na Wikipedia, cada curiosidade. Dava vida a toda a descrição, aos lugares por onde eu passara e que tinham deixado algum tipo de recordação. Talvez tenha sido o clima belo da primavera ou a proximidade da partida, mas muito provavelmente o que eu dizia não era mais do que a verdade pura e simples: Nantes é bela e sedutora ao seu modo. Não a sedução lânguida e cinematograficamente arrebatadora de Paris, mas uma atração sóbria e sólida, que se instala sem que percebamos, um amor que nasce da convivência e não da paixão. Meus comentários surpreenderam a Ju, tão acostumada com as minhas queixas sobre a capital do Oeste, mas eu posso garantir que o mais surpreendido de todos foi eu mesmo.

No response to “Saindo de Nantes... e chegando em Paris”

Postar um comentário