Neve. Neve? Neve!

Sim. Neve. Esta é uma postagem diferente: não dá para fazer aquela minha sinopsezinha sedutora no início do texto porque já se espera o que vem por aí. "Ah, ele vai falar que nevou em Nantes". Bingo, parceiro! Mas nem por isso eu vou deixar de reservar uma ou duas surpresinhas para você. Melhorou, hein?

Como deu pra ver na série de textos "Picolé de Rapadura" a chapa aqui estava esfriando. No fim de semana de 12 e 13 de dezembro os termômetros em Nantes marcaram abaixo de zero pela primeira vez. O balde com água sanitária que eu e o Thiago usamos para limpar a bagunça que a Fanfrale fez na casa dele semana retrasada (longa e traumática história que eu ainda não tive coragem de compartilhar convosco neste humilde blog) foi esquecido na varanda e congelou, fazendo do cabo da vassoura o palito de picolé mais comprido que eu já vi. Achei que a queda seria razoável, saímos dos 3 ou 4ºC e chegaríamos a 0 e -1ºC. Bom, ledo engano. Os termômetros não pararam de descer e chegamos a enregelantes -8ºC de mínima durante a semana.

Já fazia bastante tempo que a meterologia previa neve para dali a uma semana. E todos os dias ela era atualizada, a neve adiada por mais um dia e a ''semana" nunca terminava. Confesso que estava incrédulo, pois várias vezes ouvi falar que em Nantes é muito raro nevar em virtude da proximidade do oceano. Mas uma hora a metereologia marcou a neve em um dia e não mudou mais: sexta-feira 18 de dezembro, último dia de aula. Então era pagar para ver.

Fui dormir tarde na quinta-feira não me lembro por qual razão e a doce expectativa de uma manhã de sexta-feira sem aulas embalou meu sono. Até as 8:00. Foi quando um colega brasileiro me ligou com o maior entusiasmo do mundo:

- Angelo, tá nevando, cara!
- Poxa, legal. Mas tô com sono. Vou voltar a dormir, a neve vai estar lá quando eu acordar.
-Tá nevando, cara!
- Valeu, Rodrigo. Vejo depois.


Constatação 1: minha capacidade de se surpreender e se deslumbrar fica altamente comprometida quando estou com sono. Mais uma para entrar para a lista, junto com a capacidade de julgamento, a capacidade de dirigir e o bom senso. Olhei pela janela, vi calçadas brancas da neve, constatei que estava nevando. E voltei a dormir...

Até as 9:00, quando a Juliana manda uma mensagem singela, mas bastante expressiva, para todos os brasileiros. Meu celular apitou com a mensagem "Neve!". Quatro letras, uma exclamação, mil emoções contidas em cinco caracteres. Muito lindo. Mas não lindo o suficiente para me tirar a turvação que o sono provocava. Me levantei resmungando algo do tipo "essa m... dessa neve que não me deixa dormir", peguei a câmera tirei uma foto da rua para provar para a galera no Brasil que tinha visto neve e voltei a deitar... Eis a foto:


E dormi até as 10:00. Foi então que a campanhia tocou. Cara amassada, despenteado, me levantei para atender a porta, pois o meu colocatário não estava em casa, com a certeza de que era um brasileiro me chamando para ver neve. E não estava errado, era o Rodrigo (o mesmo do telefonema duas horas antes). E ele foi super eficiente, trouxe até uma bola de neve para mim, que ele jogou na minha cara antes de me perguntar se eu estava dormindo quando ele tocou a companhia. Evidentemente fui muito compreensivo com a brincadeira. Foi por isso que eu o expulsei da minha casa e voltei para a cama. Constatação 2: meu bom humor também é comprometido pelo sono.

Mas a qualidade do sono já não era a mesma e decidi que era hora de dar cabo na rabugem, me levantar e fazer como todo bom brasileiro que jamais vira a neve. Me vesti, liguei pro Rodrigo pedindo desculpas pela minha recepção rabugenta e dizendo que se ele quisesse se desculpar da bolada de neve na minha cara, que descesse para tirar umas fotos comigo. Desci antes dele, recrutei um pequeno pelotão de colegas que estavam conversando no exterior para lançar bolas de neve nele e me senti vingado. Agora sim eu podia apreciar a neve. Depois de levar inúmeros petardos gelados, ele tirou essa foto minha:


Decidi ir ao centro da cidade com o Roger e o Thiago para tirar algumas fotos. Como é habitual, o Thiago se atrasou e segui na frente com o Roger fotografando as imediações da Île de Versailles. Aqui vão algumas delas:

O Rio Erdre nas imediações da Île de Versailles. Pouca neve na foto.


E uma parte do rio congelou.

E uns pássaros aproveitaram para dar uma de Jesus Cristo.

Não sem antes deixar as marcas na neve.



Deu até para tirar umas fotos no estilo "Frio? Mas que frio? Não tinha nem percebido".


Quando já estávamos longe chegou o Thiago com os dois mexicanos e uma bola de neve pouco menor do que uma bola de basquete. Uma pequena pausa para fazer um vídeo hilário (que espero postar aqui em breve com os outros vídeos que estou devendo) e mais algumas fotos:






Voltamos para a escola e após almoçarmos fizemos uma breve guerra de neve nas quadras de tênis, que por conta da distância ainda estavam imaculadamente cobertas com um tapete branco. Então fui para as minhas últimas quatro horas de aula do semestre: trabalhos práticos de termodinâmica com um coletor solar e um trocador de calor (sol e calor, que ironia, estão em falta por aqui). O acúmulo de neve aqui é um acontecimento fortuito, pois é preciso que o chão esteja seco para a neve se acumular. Do contrário, ela derrete assim que chega ao solo. O acontecimento de sexta-feira foi um golpe de sorte, pois ele sucedeu uma semana de muito sol e nada de chuva, coisa rara por aqui. Desde então nevou mais duas ou três vezes, algumas delas acompanhadas de chuva, e em nenhuma dessas ocasiões a neve voltou a se acumular como no dia 18. Uma pena.

Pela noite, um último trabalho. A Fanfrale tinha um contrato e lá fui eu com eles. Descobri que tocaríamos ao ar livre (temperatura : -1ºC). Resolvi que seria melhor tocar sem luvas para manter a sensibilidade e conseguir tocar as teclas certas. Em dois minutos meus dedos estavam congelados e eu não tocava mais nada. Não que eu tocasse muita coisa antes também... Todos os instrumentos soavam desafinados por causa do frio. Em cinco minutos gotículas da minha saliva congelaram nas articulações, espumas e cortiças das chaves do saxofone e algumas notas simplesmente pararam de funcionar porque as válvulas ficaram bloqueadas.

Tocamos para o que eu acredito ser a associação do bairro. Era um bairro de periferia, com prédios altos e notadamente mulçumano. Nosso trabalho era tocar no meio da rua, se detendo pouco tempo na frente de cada prédio para chamar a atenção dos moradores. O objetivo era que eles descessem (naquele frio) para participar de uma festinha que estava acontecendo na praça. A praça tinha uma pequena fogueira, ao redor da qual as crianças brincavam. Mais ao longe uma segunda fogueira, enorme. Ao nos aproximarmos comecei a achar a fogueira esquisita. Foi então que eu vi que se tratava de um carro...

E agora (merecidas) férias! A expectativa de uma viagem rápida de dois ou três dias pela Bretanha e o Reveillon em Paris.



2 Responses to “Neve. Neve? Neve!”

Lays Tatagiba disse...

fim de post foi em minha homenagem, pode dizer!
hahahaha

enxerida que só eu... =)

bom natal e um ótimo 2010!

Fred Becco disse...

"Eita, mah!" Deve tá frio mesmo...
Primo, gostei do teu blog. E parabéns, vc escreve bem.

Não sabia desse dote artístico do sax. Vou aprender a tocar baixo e quando vc voltar ou eu aparecer por aí montaremos uma banda. (rs)

Aqui em fortal tá quente, muito quente, tá um inferno! Quer trocar? (rs)

Abração, mermão. Feliz ano novo em Paris!

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